Imprensa Valorizar os oceanos, protegendo-os

Artigos de Opinião | 29-06-2022 in Diário de Notícias

Há alguns anos, em 2017, na altura ao serviço da Comissão Europeia, participei na preparação de uma opinião científica, intitulada Food from the Oceans, na qual se partia de uma constatação: os oceanos são responsáveis por quase metade da produção biológica do planeta, mas representam apenas 2% das calorias e 15% das proteínas para consumo humano.

Este é um facto que seguramente surpreenderá muita gente, tendo em conta a consciência que temos do uso intensivo que fazemos de determinados recursos marinhos, e das consequências que essas práticas têm nos ecossistemas e na biodiversidade. Mas a contradição é apenas aparente.

O problema, na nossa relação com os oceanos, não está em beneficiarmos do que estes nos oferecem e nos podem oferecer. Pelo contrário: com uma população humana em constante expansão, iremos inevitavelmente depender cada vez mais destas riquezas, até porque é em terra firme que estamos já a atingir o limite daquilo que podemos produzir. O problema - ou antes o desafio - é encontrar formas de o fazer sem comprometer a saúde e o equilíbrio dos oceanos, e até melhorando-os consideravelmente.

É precisamente esse o desafio que está em cima da mesa na Cimeira dos Oceanos das Nações Unidas, que decorre nesta semana em Lisboa. O ponto de partida é a proteção dos oceanos, não apenas da pesca excessiva e desregulada, mas também da poluição e das alterações climáticas que estão já a destruir ecossistemas sensíveis como os recifes de corais. Mas a meta, como referiu António Guterres na sua intervenção desta segunda-feira, é "mostrar compromisso com uma economia azul sustentável". Ou seja: corrigir erros, encontrar novas estratégias e construir com os oceanos uma nova relação, ainda mais forte.

Na opinião Food from the Oceans, que contou com a atual ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Elvira Fortunato, na lista de conselheiros de alto nível que contribuíram para a sua elaboração, procuravam-se exatamente as fórmulas para combinar este duplo objetivo da proteção e exploração sustentável dos recursos. E é gratificante constatar que algumas das propostas que na altura estavam em cima da mesa, nomeadamente o aproveitamento de fontes de nutrientes inexploradas, como as algas e o plâncton, estão agora nas notícias dos jornais e das televisões a propósito da conferência das Nações Unidas.

É precisamente este caminho - a aposta em soluções inovadoras, apoiadas na investigação científica de excelência - que irei defender nesta quinta-feira em Lisboa, num evento dedicado à missão do Horizonte Europa Starfish 2030, que ambiciona restaurar os nossos oceanos, águas costeiras e interiores até ao final da década. Uma conferência em que participarão a comissária europeia Mariya Gabriel, o presidente da Câmara de Lisboa e antigo comissário europeu Carlos Moedas, representantes do governo português e das Nações Unidas.

Sempre acreditei que a investigação científica e a inovação seriam cruciais para a construção desta economia azul de que agora falamos. E foi por esse motivo que introduzi os oceanos como tema independente no Horizonte 2020, quando fui uma das relatoras desse programa-quadro; me bati com sucesso pela criação de uma Comunidade de Conhecimento e Inovação dedicada a todos os temas relacionados com a água, na agenda estratégica do Instituto Europeu de Inovação e Tecnologia (EIT), no âmbito do Horizonte Europa; e venho defendendo a aposta na modernização e em soluções inovadoras para as indústrias do mar na Comissão das Pescas, no Parlamento Europeu, da qual sou atualmente vice-presidente.

A essa certeza, junto outra: no que respeita aos oceanos, e à proteção do ambiente em geral, apenas teremos sucesso trabalhando com os setores e comunidades que dependem dos recursos que pretendemos preservar. Temos de proteger os oceanos com as pessoas e para as pessoas, sem nunca as deixarmos à margem das decisões.

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