Imprensa O papel da cultura reconhecido no programa-quadro da ciência e inovação

Artigos de Opinião | 03-02-2021 in Diário de Notícias

Os setores cultural e criativo, por natureza dependentes de público, têm sido particularmente penalizados pela pandemia de covid-19. O primeiro impacto é sentido diretamente pelos profissionais destas áreas, que atravessam dias de grande incerteza. Mas, não tenhamos dúvidas, todos nós saímos a perder com a presente situação.

A cultura é uma fonte de prazer, de enriquecimento espiritual, de harmonia. Reforça o nosso sentimento de pertença às diferentes comunidades em que nos inserimos. Ajuda a combater radicalismos e populismos e a preservar a memória dos bons e maus acontecimentos do passado.

Além de tudo isto, é uma inesgotável fonte de inspiração para todas as outras áreas do saber, da filosofia à matemática, e para todos os setores, da moda à alta tecnologia, contribuindo ainda de forma decisiva para a economia e para o emprego.

 

Por isso, foi para mim uma alegria termos esse carácter essencial e transversal da cultura e da criatividade reconhecido no programa-quadro da Ciência e Inovação Horizonte Europa, no qual, pela primeira vez, esta passa a fazer parte de uma rubrica própria, intitulada "Sociedade Inclusiva e Criativa", à qual foram alocados 1250 milhões de euros do quadro financeiro plurianual da União Europeia (ou 1% do Horizonte Europa), os quais serão ainda reforçados através de outros instrumentos, podendo ultrapassar os 2000 milhões no total.

Para se ter uma ideia do enorme salto que isto representa em termos de investimento, de acordo com dados da Comissão Europeia, no anterior programa-quadro, o Horizonte 2020, foram aplicados cerca de 500 milhões de euros em projetos de investigação ligados a estas áreas, provenientes de diferentes vetores, mas genericamente agrupados na categoria de "herança cultural".

O novo programa será muito mais abrangente, mais bem financiado e, não menos importante, procurará ter uma visão e uma estratégia integradas para todas as vertentes da cultura e da criatividade.

O Instituto Europeu de Inovação e Tecnologia, parte do Horizonte Europa, e de cuja agenda estratégica fui relatora pelo Parlamento Europeu, passará também, já a partir de 2022, a ter uma nova Comunidade de Inovação e Conhecimento dedicada aos setores cultural e criativo.

Em que é que estes fundos e iniciativas se irão refletir em termos práticos? Em projetos de proteção do património histórico material e imaterial da Europa, no apoio à digitalização dos setores cultural e criativo, na educação para a cultura, na cultura com fator de valorização da noção de cidadania e, claro, através de inúmeras iniciativas destinadas a valorizar o trabalho de todos os agentes envolvidos nestas áreas, dos artistas e intérpretes aos museus e galerias.

Este passo não irá resolver todos os problemas. A aposta via Horizonte Europa será mais eficaz se conjugada com outros instrumentos de financiamento. O Parlamento Europeu recomendou recentemente que pelo menos 2% dos planos de recuperação dos Estados membros sejam dirigidos para os setores cultural e criativo.

O plano do Governo português, no entanto, não os identifica como uma prioridade. Mas este ainda vai a tempo de tomar algumas medidas para não desperdiçar esta grande oportunidade. Sociedades com mais cultura e criatividade fazem países melhores.

 

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